De Viis Maris
Sem moito preámbulo, eis a minha traduçom das secções
correspondentes ao NW da península ibérica do De
viis maris, um itinerário marítimo inglês do século XII que conhecim
ainda hai pouco numha
entrada de Arqueotoponímia, o blog de Andregoto Galíndez. Bo proveito!
~o~o~o~
III. Despois, en
terra do rei de Navarra, hai um monte grande chamado Funtrabi [Fonterrabia/monte Jaizquíbel], que dista três milhas[i] de Huarcha. Despois hai um bo porto que chamam
Sanctus Sebastianus [Sam Sebastiám/Donostia] de Navarra, e na entrada
deste porto hai umha grande torre de pedra. Despois está a ilha que chamam de Catharie [Guetária], e hai aí porto bo e
profundo, e a devandita ilha hai que a deixar á dereita ao entrar. Despois vem
o rio de Castre [Castro Urdiales] que
divide a terra do rei de Navarra das do rei de Castela, se bem nom hai ali nem
porto nem ancoradoiro.
Despois em terras do rei de Castela na
ribeira do devandito rio de Castro hai um monte grande chamado Castro, do que
toma o seu nome o rio. E despois em terra do rei de Castela está o burgo
chamado Ordialis [Urdiales]. Despois em
terra do rei de Castela hai um porto bo e profundo chamado Santa Maria de Portu [Santa María del Puerto, Santoña],
e hai aí um monte grande que chamam le
Vilan [Monte Buciero?] pola similitude cuns viláns no cume desse monte[ii]. E
antes deste porto hai umha ilha que chamam Sam Martinho de Laree [Laredo] que se deixa ao lado esquerdo ao entrar ao porto.
Despois em terra do rei de Castela hai um bo porto que chamam Dudel [?], e no medio del hai umha ilha.
E a ambos lados a entrada é ampla e profunda.
Despois estám os montes de Sore [Picos de Europa?] que dividem as
terras do rei de Castela das do rei de Sancto
Iacobo [Santiago], e dim que nom hai montes máis altos em toda Hyspania [Espanha / Península Ibérica].
Compre saber que a terra onde habitam os Bascos chama-se Biscaia, que começa na
devandita ilha de Guetária e chega até Santonha.
IV. Despois, na
terra do rei de Santiago nom longe dos montes de Sore, hai um porto bo ao que
chamam Melias [?]. Despois hai um porto ao que chamam Giguin
[Gijom], mais nom é bo, e hai aqui um monte grande ao que tamém chamam Gijom.
Despois na terra do devandito rei hai um porto e vila chamada Abilis
[Avilés] e hai aí um castelo chamado Gozsun [Gozom] ainda que nom hai aí
um bo porto exceto por necessidade e co mar alto. E hai aqui uns montes que
chamam Bumais, e a toda essa província chamam Bumais. E entre
Gozom e Sanctum Saluatorem [Sam Salvador de Oviedo] ao que chamam lugar santo e
é requisito de peregrinos, som cinco léguas. Despois em terra do devandito rei
hai um bo ancoradoiro ao que chamam Artede
[Puerto de Vega, Navia, a 4km do lugar de Artedo] e o devandito ancoradoiro
está junto ao castelo que chamam Caprafiga [Cabrafigal, Navia].
Despois em terra do devandito rei está o
porto e bo burgo que chamam Ribadure [Ribadeu],
e máis é o seu porto bo e profundo e bo de capacidade, ainda que é melhor polo
lado esquerdo. Despois em terra desse rei hai um monte grande e excelso que
chamam Mundike [Mondigo], que dista
de Ribadeu umha milha, e este monte deve deixar-se á dereita ao entrar. E
despois em terra desse rei hai um porto bo e profundo e de boa capacidade
[Celeiro?], e cuja entrada está bem longe do porto, onde hai umha pequena ilha
á esquerda segundo se entra [Ansarom] e junto a que hai um ancoradoiro
suficientemente bo [Portocelo]. Daí a quase umha milha hai umha aldea que
chamam Sanctus Iohannes de Koua [Sam
Joám de Covas]. Despois em terra desse devandito rei hai umha ilha, a que
chamam Sancti Michaelis Cunicularia [Coelheira], dita assi
porque hai nela quantidade de coelhos, e essa ilha fica entre o porto que
chamam Stephanum de Bimarre [???] e portum de Sore [Sor ~ Porto do
Barqueiro]. E do outro lado desta ilha hai umha entrada boa e profunda até o
porto do Sor, e esse porto do Sor é amplo e profundo, se bem nom hai acô ancoradoiro
devido às grandes ondas do mar que chegam diretamente. E hai aqui umha vila boa
e igreja chamada Sancta Maria de Baris [Santa Maria de Bares]. Ainda
assi dentro deste porto longe da entrada hai recetáculos bos e seguros, se bem
as naves nom poder sair do porto do Sor quando sopra o vento do noroeste. E hai
aqui à entrada do porto á dereita segundo se entra um monte grande chamado Zagunel
de Baris [Semáforo/Cabo de Bares?].
Despois na terra deste rei, imediatamente
despois de Zagumel de Bares, hai um porto ao que chamam Ortigare
[Ortigueira], e a entrada do seu porto polo médio é segura, e entrando á
dereita hai umhas pedras altas e gráceis às que chamam as Aguilles de Ortigaire [Os Aguillóns/Cabo Ortegal]. E aí no cúmio
dum monte alto está o castelo de Sancti Stephani de Ortingaire [Castelo
do Casom, Devesos?], se bem nesse porto nom hai um bo ancoradoiro devido à
chegada direta das grandes ondas do mar. Despois em terra daquel rei hai um
porto bo e profundo ao que chamam Sedaire [Cedeira], e à entrada deste
porto hai um monte grande ao que chamam Candieris [Monte Candieira]
junto ao que está a via de navegaçom para evitar as lajes que hai à entrada
desse porto, à dereita segundo se entra, e que estám cobertas co mar alto. E
nesse porto está a igreja de Santa Maria do Mar. E despois em terra do
devandito rei hai um monte grande que se interna longamente no mar e ao que
chamam Prior [Prior]. E entre Cedeira e este monte nom hai porto nem bo
ancoradoiro porque o fundo do mar é rochoso.
E imediatamente despois de deixar atrás o
monte esse ao que chamam Prior hai à esquerda três portos ótimos reunidos,
nomeadamente Inne de Briun [Briom,
Ferrol] et Iunckare [=Junqueira = ria
de Ares] et le Far [Burgo de Faro,
Culheredo]. A entrada do porto de Inne
está entre dous montes e, já dentro, hai moitos recetáculos bos e amplos, e à
parte esquerda do porto hai monges da orde cisterciense. E o seu fogar é
chamado Briom, e desse porto podem sair as naves com vento do norte e do
noroeste e de oeste e de sul e de sudoeste. O porto de Junqueira é ancho e
profundo e, no medio da entrada, hai umha ilha á que chamam Marole
[Marola] que se deixa à dereita ao entrar, e ascendendo chegamos à igreja que
chamam Sanctus Georgius de Turribus [Sam Jurjo de Torres, Vilarmaior
(!!!)]. E diante dessa igreja hai um ancoradoiro de naves, e subindo por esse
rio, quase por sete milhas, hai umha boa vila e fértil que do mesmo modo chamam
Le Far [O Burgo do Faro, O Temple], que é vila dos templários. E dessa
vila contam-se nove milhas até Sanctum
Iacobum [Santiago].
Despois em terra desse rei hai um monte
grande que chamam Kayon [Caiom], e despois hai umha ilha grande à que
chamam Cesarga [Sisargas], e dista do
porto de Faro por quatro milhas. E nessa ilha hai três casas de heremitas, e nengumha
nave pode passar com segurança entre a ilha e a terra. E despois em terra deste
rei hai um porto bo ao que chamam Yuorie [Javinha (Xaviña)] e na entrada
desse porto hai um monte grande ao que chamam Villanus de Yuorie [Cabo
Vilám], e a similitude cuns viláns está no cume do monte que fica à esquerda
segundo se entra. E no medio desse porto hai um passo. E o porto esse dista da
ilha Sisarga v milhas, e á dereita entrando está a vila que chamam Sancta
Maria de Yuorie [Santa María de Xaviña].
Despois na terra do devandito rei hai um monte grande que
se interna moito no mar e que é chamado Fenestres [Fisterra], e ali está
a igreja e vila que chaman Sancta Maria de Fenestres [Santa Maria de
Fisterra], ainda que nom hai aí porto nem bo ancoradoiro, se bem a quase umha
milha hai um porto bo chamado Cee [Cee], e antes da sua entrada hai umha
ilha e umha laje que se deixam à dereita ao entrar [ilhas Lobeiras e
Carrumeiros]. E junto a esse porto hai um bo ancoradoiro ao que chamam aqua
de Esare [Ézaro], e junto a esse rio hai um monte grande ao que
chamam le Pinal de Esare [O Pindo], dito assi porque os pinos medram
nel, e o devandito monte deixa-se á dereita do ancoradoiro. E despois em terras
desse rei hai um porto bom ao que chamam Tamar [=Tambre: Ria de Noia e Muros]
que dista 6 milhas de Santiago. E junto a esse porto hai um monte grande
forcado [Tremuzo?] que deve deixar-se à esquerda ao entrar. E no medio desse
porto hai um passo de navios, já que á esquerda hai lajes e à dereita areas.
Despois hai um monte agudo que chamam Sanctus Albertus
[Monte de Sam Alberte em Ribeira / A Curota na Povra], e junto a esse monte
está Petra Sancti Iacobi [Pedra de Santiago = Padrom], e ai hai um porto
que dista do do Tambre por umha milha. E no medio desse porto hai umha ilha que
chamam Saluer [Sálvora] que deve deixar-se à esquerda ao entrar. E a
entrada desse porto dista duas milhas de Padrom. E Padrom dista 4 milhas de
Santiago. E fai-se notar que junto á ilha de Sálvora hai algumhas lajes
perigosas e moi temidas polos transeuntes à que chamam le Ordure de Thare [=
Teira: Baixos de Corruvedo] e que se adentram no mar por duas milhas. E quando
o mar está alto estám cubertas e non podem ver-se, e deixam-se á esquerda
segundo se entra ao porto de Padrom, e polo tanto compre, ao passar polo porto
do Tambre, afastar-se da terra cara ao mar para evitar a devandita laje de Tayre
[Teira].
Despois em terra desse rei e nom longe da ilha de
Sálvora hai um porto bo que chamam Punteuedre [Pontevedra], e hai aí um
bo burgo tamém chamado Pontevedra. E diante desse porto hai umha ilha grande
chamada Aunis [Ons][iii] que se
deixa à dereita ao entrar a esse porto. Despois está o porto que chamam Mior
[Minhor] e um burgo bo que de igual modo chamam Mior [A Ramalhosa - O
Burgo], e nesse burgo hai duas torres de pedra que se deixam à esquerda ao
entrar. E despois em terras do devandito rei nom longe de Minhor hai umha
grande abadia pola beira-mar ao que chamam mosteiro de Hoy [Oia] que tem altas
torres que chamam Torres de Oia, ainda que nom tem porto nem ancoradoiro.
Despois em terra desse rei non longe dessa abadia hai um porto bo que chamam aqua
de Mine [rio Minho], a cuja entrada hai um monte forcado [Santa Trega] que
se deixa à esquerda ao entrar. E a entrada no medio do porto hai umha ilha [a
Ínsua]. E o rio Minho divide as terras do rei de Santiago das do rei de Portegail
[Portugal]. E sobre o rio Minho em terras do rei de Santiago hai umha cidade
boa à que chamam Tine [Tui] que dista da entrada do porto 4 milhas. E
assi que a auga do Minho chega á devandita ilha que hai á entrada do porto
divide-se em duas partes. E aquela contra a terra do rei de Santiago chama-se Galega
[ = ], ja que toda a terra do rei de Santiago chamase Galicia. E a parte que
está contra a terra do rei de Portugal chama-se Maurisca [mourisca],
porque veu da terra dos Mouros.
VI. Na terra do rei de Portugal, junto à entrada
do porto do Minho da parte que chamam Mourisca hai umha torre de pedra. E deve
fazer-se notar que do outro lado da ilha que está á entrada do Minho nom podem
as naves grandes entrar nem com marea chea. Em terras deste rei nom longe da
auga que chamam Mourisca hai um bo porto que chamam aqua de Lime [río
Límia], e ali hai um monte grande que chamam monte de Onur [Mt. Santa Luzia], e a entrada ao porto está entre o devandito
porto e as areas brancas que hai do outro lado, e esse monte deve deixar-se à
esquerda ao entrar, e a area á dereita ao entrar. Deve fazer-se notar que quase
todas as areas que hai atá Lisboa som brancas. (…)
~o~o~o~
Primeiro, ao ser um itinerário elaborado contra o 1190,
assistimos ao nascemento dos primeiros burgos medievais, lavoura impulsada
sobre todo desde a própria monarquia galego-leonesa. Já temos aí Ribadeu, o
Burgo na ria da Coruña, Pontevedra, e o Burgo de Minhor; mais ainda nom temos
Viveiro, Betanços ou A Corunha; Noia nom é mencionada (apenas como Porto do
Tambre), e o Burgo de Minhor ainda estava na Ramalhosa e nom em Baiona.
Outro detalhe, o que hoje é conhecido como reino de Leon
é descrito polo autor inglês como a terra do rei de Santiago, e quando tem que
lhe dar nome a esta terra o nome dado é Galicia. Lembremos que já em
vida do rei Afonso VII o emperador, este coroou reis aos seus filhos, mantendo
para si o título imperial. Assi, o futuro Fernando II de Leom já é reconhecido
como rei de Galicia em documentos de,
por exemplo, o mosteiro de Vilanova de Ozcos (cf. n. 4 e 5). Ainda que a
morte do seu pai os seus diplomas amossam umha clara preferência por se apresentar
mais como rei de Leon, ou mesmo dos Hispanos, que como rei de Galiza, ou de
Leon e Galiza. Nesse senso, o seu filho (hoje conhecido como Afonso IX)
empregará mais ou menos coa mesma frequência os títulos de rei de Leom, e de
rei de Leon e de Galiza; mais nom lhe conheço o emprego do título de rei de
Galiza em exclusividade. Se no século X nom poucos diplomas e crónicas situam a
cidade de Leom na Galiza, para o século XIII já se tinha consumado a separaçom
(nom política) entre o nosso país e o país leonês; mais nas fontes inglesas ainda
é Galiza o nome do país, e Santiago a máis célebre capital do reino. Algo
similar temos numha outra crónica inglesa coetánea, mesmo pode que da mesma
autoria; na Narratio de Itinere Navali Peregrinorum Hierosolymam
Tendentium et Silviam Capientium, de 1189, onde se narra a captura
de Silves por cruzados ingleses no ano 1189, explica-se que “devemos ter em
conta que hai cinco reinos entre os espanhóis, nomeadamente de Aragom, o dos
Navarros, e esse que especificamente é chamado dos espanhóis e cuja capital é
Toledo, assi como tamém aquel dos habitantes da Galiza e de Portugal”
[“Considerandum etiam quod, cum sint quinque regna in Ispaniorum, videlicet
Arragonensium, Navarrorum et eorum qui specificato vocabulo Ispani dicuntur,
quorum metropolis est Tolletum, item incholarum Galicie et Portugalensium”].
Por último, e se interpreto
corretamente, que a beira norte do Minho levasse por nome Galega e a sul
Mourisca tem o seu aquel, e deve-se remeter a um estado de cousas moi
antigo. Lembremos que Porto ou Coimbra já foram (re)conquistadas pola nobreza
galega no século IX, quer-se dizer, antes do ano 900.
[i]O
texto indica miliares que traduzo por milhas.
[ii]Nom
sei se a minha traduçom é de todo correta; o texto original di: “et est ibi
mons magnus que qui dicitur le Vilan, quia similitudo cuiusdam uillani stat in
cacumine montis illius”.
[iii]No
texto editado Amis, que penso deve ser mala leitura ou transmissom de Aunis.
Muy buenas. Soy Óscar González Murado. Me gustaría ponerme en contacto contigo para una propuesta. No encuentro donde puedo enviarte un mensaje privado.
ResponderEliminarOlá, Óscar. Podes contactar comigo neste enderezo electrónico: o.cossue@gmail.com. Saúdos.
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